terça-feira, 4 de outubro de 2011

Rafinha Bastos X Wanessa Camargo. O relativismo da ética na TV brasileira.


O recente episódio envolvendo o apresentador Rafinha Bastos, do programa CQC, e a cantora Wanessa Camargo indicam quão volúveis são os conceitos éticos da TV brasileira, que é, mesmo que não generalizadamente o reflexo da noção de ética na nossa sociedade, não apenas para a definição do dito politicamente correto e a partir deste o oposto, mas também das questões de aplicação dos mesmos.
O fato é o seguinte: no programa exibido dia 26 de setembro, pela TV Bandeirantes, o apresentador e humorista Rafinha Bastos fez um comentário polêmico sobre a cantora.
Na ocasião Rafinha disse que "comia ela e o bebê", fazendo alusão a boa forma da cantora. Evidente que ela está grávida, e que o caso não é de canibalismo, nem pedofilia. Mas o certo é que, tanto a cantora quanto seu marido, Marcos Buaiz, não deram risadas. Sentiram-se ofendidos e isso é compreensível, além de um direito de qualquer pessoa. Mas o que veio a seguir não acontece após qualquer pessoa sentir-se ofendida, ocorre apenas para poucos.
O comentário fez com que Rafinha fosse deposto temporáriamente de sua cadeira cativa no programa, por ordem da emissora. Segundo a jornalista Mônica Bérgamo, em sua coluna na Folha de São Paulo, a decisão se deu após uma ligação feita por Ronaldo(fenômeno), sócio de Buaiz, diretamente a cúpula da emissora.
A questão é diversa, então vamos partir do seguinte: o apresentador faz humor desta maneira, e assim se projetou.
Seja na bancada do programa ou em seus shows de stand-up, essa é a linha de humor que, tanto o programa, a rede de TV , e, principalmente, o público, estão habituados a receber de Rafinha Bastos, sempre foi.
Provavelmente os números e os fatos sejam relevantes para analisar a questão:
O humorista tem modestos 3 milhões, 191 mil 401 seguidores no twitter.
A rede Bandeirantes o escalou para apresentar um especial de fim de ano (agora já se cogita que não será mais ele), além de ser o principal repórter do programa A Liga, exibido nas terças. O que significa que sua participação tem sido bem proveitosa para a TV, caso contrário não estaria no ar 3 vezes por semana.
Então porque a TV Bandeirantes tomou tão rigorosa medida desta vez? Digo desta vez pelo seguinte, e este é o ponto que me interessa:
A algum tempo atrás, entidades de movimentos em defesa das mulheres tornaram pública sua insatisfação com uma piada feita por Rafinha sobre mulheres e estupro, onde dizia que mulheres feias deviam agradecer caso fossem estupradas. Achei de mau gosto, muito, mas o importante é que, nada de "importante" surgiu desta indignação dos grupos feministas e afins.
Vejam então que, se vamos falar de politicamente correto ou não, o caso é contraditório.
Não creio que 1% das mulheres se dignariam a mover um processo ou pedir uma reprimenda ao apresentador, mas se quisessem(e poderiam)o fim seria o mesmo? Será que a Bandeirantes iria tirar do ar um apresentador de sucesso após pessoas comuns sentirem-se ofendidas?
É provável que a emissora alega internamente que a conduta do apresentador pode atrapalhar contratos publicitários. Mas após esse primeiro fato, o da triste piada do estupro, não se viu queda de audiência do programa, ou saída de anunciantes (por sinal muitos). Tampouco houve queda na popularidade do humorista. Tudo continuou como antes, inclusive a bancada do CQC. Nenhuma nota de desculpas velada e menos ainda suspensão do humorista.
Mas no caso da "famosa" cantora a medida foi outra. O clássico "1"peso e "2"medidas. Por razões de conduta ética e preservação da imagem da instituição a emissora tomou uma atitude severa, afastando o apresentador.
Não é apenas relativismo ético, é a constatação de que o problema não é o que Rafinha Bastos diz em suas piadas que incomoda a Bandeirantes, a questão é para quem diz e em qual contexto. O problema não está em ridicularizar grupos, minoritários ou não, ou fazer piadas de gosto duvidoso. Tendo anunciantes e audiência, tudo bem! Segue em frente.
Mas se o ridículo atinge um grande empresário com enorme trânsito nas mídias e uma artista com um sobrenome de sucesso, aí não! Entra o politicamente correto em campo e trata de defender a honra e a moral, distribuindo "cartões vermelhos" e notas de austeridade.
Quem sabe se ele não tivesse dito nada sobre a gravidez, e apenas " eu pego ela..." talvez nem ela nem o marido se incomodassem. Seria um elogio, vai saber...como saber o que afaga o ego dos famosos? Sempre ávidos por notoriedade e manchetes.
Não defendo nem reprovo o teor do humor feito por Rafinha, cada um assiste o que quer, e acha graça se quiser; mas acho hipócrita e bajuladora a postura da emissora, demonstrando que a sua ética não segue os padrões da sociedade como um todo, como deveria ser conceitualmente; mas que, o status social, esse sim, define o padrão de ética e o rigor no ajustamento de conduta de seus representantes.
É o retrato dos valores que recebemos da mídia e dos midiáticos. Ou melhor, da falta total de valores.

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