domingo, 20 de novembro de 2011

A arte do tédio.

Domingo a tarde não é fim de semana, é prenúncio de segunda-feira. O fim de semana é o oásis em meio ao deserto do sono atrasado, das reuniões de trabalho ou das horas extra. E como bom oásis, ele desaparece rápido, mais ou menos na hora em que você descobre onde é a fonte de água cristalina atrás dos coqueiros esverdeados, que fica entre o fim da sexta e o almoço de domingo!
No fim, a vinheta do Fantástico não é a chamada de um programa de variedades jornalísticas, é na verdade o primeiro soar do despertador para o trabalho, é um convite para mais uma semana de ganha pão, e isso pode ser duro se você não estiver bem resolvido com a realidade de que a aposentadoria, é algo muito futurístico quando se tem vinte ou trinta anos.
O tédio pode tomar conta de você nessa hora, quando você lembrar que passou o sábado assistindo altas horas, ou que dormiu metade do domingo e acordou com os berros do Faustão. Mas não! Seja forte, é preciso resistir.
A arte do tédio consiste em não ceder a esse convite arrasador da vida cotidiana, a se vergar ao pensamento comum, que prega que diversão deve ser regada a cerveja, churrasco, sol e baladas.
O que é tédio pra alguns não necessariamente precisa ser para você. Nada contra as festas, mas não se vive delas, ao menos que você seja promoter ou Dj , mas nesses casos não conta, porque daí já é trabalho. Bem, de volta ao ponto, não precisamos disso tudo para ter uma folga satisfatória. E esse é o princípio fundamental da arte do tédio, descobrir que você pode ser feliz sem seguir um padrão. Claro, não é fácil, requer prática e auto-conhecimento, mas é muito possível. E não duvidem, há muita alegria escondida onde muitos vêem apenas rotina.
No conforto de casa, um bom filme, boa comida, uma boa compania (ajuda muito, mas sem pressão ok? Na falta de uma boa fique sozinho e espere. ) Então, assim, seu fim de semana já não exige um sol de rachar, nem churrasqueiras crepitantes, na verdade isso pode até atrapalhar! O frio é uma ótima pedida para esses programas. E você já tem um programa de sábado ou domingo, satisfação garantida e baterias recarregadas para mais uma semana de trabalho, afinal, sem trabalho não faz sentido ter fim de semana...
A arte do tédio não é um convite a reclusão, não entendam errado, ela é uma alternativa viável e muito boa para quem não ganhou na loteria e precisa de descanso para o corpo e para o bolso. É um convite para o convívio familiar prazeroso, para a descoberta do valor das pequenas coisas da vida, sem necessidade de fogos de artifício ou batidas frenéticas de "raves".
Ser feliz da porta pra dentro é o primeiro passo para conseguir satisfação lá fora, então não vamos continuar aceitando que a vida é tediosa no sofá da sala, porque essa idéia não é nossa, ela nos é incrustada desde a adolescência, talvez, quem sabe, para nos levar a encher os shoping's, estádios e boates a procura do ouro no fim do arco-íris.
O tédio ou a satisfação está em você, depende apenas do ângulo que você escolhe para observar. Escolha o melhor ângulo dentro das suas possibilidades e descubra o que há de melhor nelas. E seja feliz sem regras pré-definidas, aceitando o que você tem e se satisfazendo com plenitude em qualquer ocasião.
Agora, se puder, evite o Faustão e o Gugu, vai ajudar bastante...
No mais, boa semana e felicidades!

sábado, 12 de novembro de 2011

O país do futebol e a política do pão e circo.

Durante cerca de 7 séculos um dos principais divertimentos no Império romano foi o espetáculo de gladiadores do Coliseu, lutas sangrentas que terminavam quase sempre com apenas um vivo.
Esse período foi conhecido como o da política do pão e circo, dado que as lutas, realizadas entre escravos treinados, divertiam a todo o império e distraíam a plebe quanto a dureza de suas vidas, sem possibilidade de ascensão social e política, e com péssimas condições de saúde e higiene, em contradição com um império riquíssimo, que despendia fortunas afim de alimentar exércitos e o luxo da nobreza.
Longe da velha bota européia, pouco mais de um milênio depois do declínio do circo romano, o Brasil ainda não tinha nome para os europeus, e esse tempo, de certo, foi suficiente para os nossos ancestrais se multiplicarem por aqui em várias tribos, diversas culturas, línguas, até sermos descobertos; massacrados e pilhados pelos colonizadores.
Sucederam-se formas de governo, políticas, massacres, populismo, ditadura, enfim. Tudo o que a história moderna nos conta até hoje.
E chegamos a 2011 como a oitava economia do mundo, mas ainda com fome, sedentos de igualdade e com muitos irmãos vivendo na miséria absoluta.
O que isso tem a ver com o Império romano? Nada. Exceto que vivemos também uma visionária política de "pão e circo", o nosso coliseu é gramado e não requer mortes( menos mal...), não se usa espadas, nem armaduras; é apenas bola e chuteiras.
O universo do futebol é tão encantador que tem o poder de arrebatar milhões de fanáticos, entretêm 100, 200 milhões de súditos por uma hora e quarenta e cinco minutos, e rende conversas e manchetes de jornais até o próximo round do espetáculo.
É tão massificante o esporte, que, nossos políticos se deram um aumento desproporcional em maio de 2006, pouco antes da Copa da África, e poucos souberam, pela rede Globo ninguém soube.
Se hoje você perguntar a um menino de 8 anos se ele quer ser o Neymar ou médico: Neymar. E olha que disse médico, porque se a pergunta for advogado, pesquisador, professor, aí ele chora e chama a mãe.
É o glamour, evidente, mas não só.
Quantias astronômicas de dinheiro são pagas aos artistas da bola, some ainda a renda com publicidade.
Clubes devem fortunas a União em impostos e o governo, mal-logrado em recebê-las, cria jogos lotéricos para sanar os débitos. Paga-se o jogo com jogo, e o jogo todo é pago pelos milhões de trabalhadores sem glamour, que cumprem com as suas carregadas obrigações em impostos mil, e mais, com a visita aos estádios, consumo de produtos patrocinados e uniformes.
Na política do pão e circo, poucos sabem o que faz o político que elegeram, mas a maioria sabe da vida noturna dos ídolos de seus times, quase ninguém conhece as artimanhas mil do congresso, mas sabe todos os pontos de seu time no campeonato, e vida que segue com as conversas políticas se resumindo a um lamento curto e as futebolísticas a intermináveis palestras sobre táticas e possibilidades matemáticas.
Certa vez li em algum lugar que o futebol é o "matrix" do povo, onde nos desconectamos da vida real para usufruir do prazer de torcer por nosso time. Mas o nosso "matrix" vem falhando, porque termina o nosso coliseu e continuamos envoltos na névoa do descaso para com a vida real.
Governos vão e vem, e nós assistimos o jogo apenas como espectadores, votos e títulos são computados e o trabalhador continua sua marcha pelo sustento, para completar a política do pão e circo, dessa vez para garantir o pão de cada dia.
Eu também gosto de futebol, nunca me excluí de nada que escrevi, não tenho essa pretensão. Mas a cada dia que passa o nosso rico país caminha para um futuro econômico e político cada vez mais importante no cenário global, e esse caminhar solicita cada vez mais cidadãos conscientes e engajados, para que o bolo, que cresce mais nos últimos anos, não continue saciando com sobras a fome de uns poucos e destilando migalhas para a grande maioria da população brasileira.
A dois mil anos atrás, os gladiadores romanos entravam no coliseu e, de cabeça baixa, diziam ao imperador: " Ave César, morituri te salutant" - que significa : "Ave César, os que estão a ponto de morrer te saúdam" . Hoje, no Brasil, certamente milhares de pessoas dizem a mesma coisa inconscientemente quando começa o espetáculo da bola, com as despensas e bolsos vazios, e a vida ruindo em miséria cotidiana, mas ansiosos pelo espetáculo. Nós temos muitos imperadores, que sabendo do conformismo de seu povo, seguem saqueando os cofres públicos e garantindo que a nova nobreza siga feliz em seus iates e jatinhos. Então eles também, inconscientemente ou não, agradecem a nossa servidão velada e trabalham para que o circo não pare.
Afinal, o espetáculo não pode parar.
Ave Cesar. . .

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Desabafos da noite.

A noite se aproxima e eu não consigo deixar de pensar na sua presença. Não te vejo, mas sei que me aguarda com a mesma ansiedade com que te procuro, antes de me render a sonolência.
Dividimos a cama tantas vezes que já não sei qual é o meu lado, todos os cantos do apartamento guardam suas marcas, tudo me lembra você e não consigo apagar essas memórias marcadas nas paredes e na minha pele.
Meu sangue corre quente pelo seu corpo e já posso ouvir seu inconfundível som sussurrando em meus ouvidos. Mas, fulgaz, você me escapa entre os dedos a todo tempo.
Quero viver sem você, mas não consigo, rechaço sua presença, não tenho sucesso.
Então continuo, dando meu sangue por ti todas as noites. E a matar-te pela manhã.
Mas a noite,novamente, aparece um clone teu a me apavorar como que a dizer com seus zumbidos: "você é meu, mesmo que me mate pela manhã, a noite estarei aqui "
Já tentei te afastar com raquetes, me intoxiquei com pastilhas de veneno, pulverizei mais veneno com querosene, mas, no fim, você sempre vence pelo cansaço, com a persistência de um guerreiro.
Enfim, eu me rendo a você pernilongo, maldito mosquito hematófago, sagaz e insaciavel. Vamos continuar nobres, partilhando cordialmente nossas noites, sempre com essa desequilibrada relação onde eu dou sangue e você me traz apenas irritação e insônia.